quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Algoritmos e propaganda ideológica direcionada: como o facebook e o whatsapp determinam a sua opinião

Título original: "Sua tia não é fascista, ela está sendo manipulada". Por Rafael Razzi


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Você se pergunta como um candidato com tão poucas qualidades e com tantos defeitos pode conseguir o apoio quase que incondicional de grande parte da população?

Você já tentou argumentar racionalmente com os eleitores deles, mas parece que eles estão absolutamente decididos e te tratam imediatamente como inimigo no mais leve aceno de contrariedade?

Até sua tia, que sempre foi fofa com você, agora ataca seus posts sobre política no facebook?

Pois bem, vou contar uma história.

O principal nome dessa história é um sujeito chamado Steve Bannon. Bannon tinha uma visão de extrema direita nacionalista. Ele tinha um site no qual expressava seus pontos de vista que flertavam com o machismo, com a homofobia, com a xenofobia, etc. Porém, o site tinha pouca visibilidade e seu sonho era que suas ideias se espalhassem com mais força no mundo.

Para isso, Bannon contratou uma empresa chamada Cambridge Analytica. Essa empresa conseguiu dados do facebook de milhões de contas de perfis por todo mundo. Todo tipo de dado acumulado pelo facebook: curtidas, comentários, mensagens privadas. De posse desses dados e utilizando algoritmos, essa empresa poderia traçar perfis psicológicos detalhados dos indivíduos.

Tais perfis seriam então utilizados para verificar quais indivíduos estariam mais predispostos a receber as mensagens: aqueles com disposição de acreditar em teorias conspiratórias sobre o governo, por exemplo, ou que apresentavam algum sentimento de contrariedade difuso ao cenário político atual.

A estratégia seria fazer com que esse indivíduo suscetível a essas mensagens mudasse seu comportamento, se radicalizasse. Como as pessoas passaram a receber as notícias e a perceber o mundo principalmente através das redes sociais, não é difícil manipular essas informações. Se você pode controlar as informações a que uma pessoa tem acesso, você pode controlar a maneira com que ela percebe o mundo e, com isso, pode influenciar a maneira como se comporta e age.

Posts no facebook podem te fazer mais feliz ou triste, com raiva ou com medo. E os algoritmos sabem identificar as mudanças no seu comportamento pela análise dos padrões das suas postagens, curtidas, comentários.

Assim, indivíduos com perfis de direita e seu tradicional discurso “não gosto de impostos” foram radicalizados para perfis paranóicos em relação ao governo e a determinados grupos sociais. A manipulação poderia ser feita, por exemplo, através do medo: “o governo quer tirar suas armas”. Esse tipo de mensagem estimula um sentimento de impotência e de não ser capaz de se defender. Estimula também um sentimento de “somos nós contra eles”, o que fecha a pessoa para argumentos racionais.

Sites e blogs foram fabricados com notícias falsas para bombardear diretamente as pessoas influenciáveis a esse tipo de mensagem. Além disso, foi explorado também um sentimento anti-establishment, anti-mídia tradicional e anti “tudo isso que está aí”. Quando as pessoas recebiam várias notícias de forma direta, e não viam essas notícias repercutirem na grande mídia, chegavam à conclusão de que a grande mídia mente e esconde a verdade que eles tem.

Se antes a mídia tradicional podia manipular a população, a manipulação teria que ser feita abertamente, aos olhos de todos. Agora, todos temos telas privadas que nos mandam mensagens diretamente. Ninguém sabe que tipo de informação a pessoa do lado está recebendo ou quais mensagens estão construindo sua percepção de realidade.

Com esse poder nas mãos, Bannon conseguiu popularizar a alt right (movimento de extrema direita americana) entre os jovens, que resultou nos protestos “unite de right” no ano passado em Charlottesville, Virgínia que tiveram a participação de supremacistas brancos. Bannon trabalhou na campanha presidencial de Donald Trump e foi estrategista de seu governo. A Cambridge Analytica trabalhou também no referendo do Brexit, que foi vencido principalmente por argumentos originados de fakenews.

Quando a manipulação veio à tona, Mark Zuckerberg foi chamado ao senado americano para depor. Pra quem entendeu o que houve, ficou claro que a democracia da nação mais importante do mundo havia sido hackeada. Mas os congressistas pouco entendimento tinham de mídia social; e quem estaria disposto a admitir que a democracia pode ser hackeada através da manipulação dos indivíduos?

Zuckerberg estava apenas pensando em estabelecer um modelo de negócios lucrativo com a venda de anúncios direcionados. A coleta de dados e a avaliação de perfil psicológico das pessoas tinham a intenção “inocente” de fazer as pessoas clicarem em anúncios pagos. Era apenas um modelo de negócios. Mas esse mesmo instrumento pode ser usado com finalidade política.

Ele se deu conta disso e sabia que as eleições brasileiras podiam estar em risco também. Somos uma das maiores democracias do mundo. O facebook tomou medidas ativas para evitar que as campanhas de desinformação e manipulações ocorressem em sua rede social. Muitas contas fake e páginas que compartilhavam informações falsas foram retiradas do facebook no período que antecede as eleições.

Mas não contavam com a capilarização e a popularização dos grupos de whatsapp. Whatsapp é um aplicativo de mensagens diretas entre indivíduos; por isso, não pode ser monitorado externamente. Não há como regular as fakenews, portanto. Fazer um perfil fake no whatsapp também é bem mais fácil que em outras redes sociais e mais difícil de ser detectado.

Lembram do Steve Bannon, que sonhou com o retorno de uma extrema direita nacionalista forte mundialmente? Que tinha ideias que são classificadas como anti minorias, racistas e homofóbicas? E que usou um sentimento difuso anti “tudo que está aí”, e um medo de os homens se sentirem indefesos para conquistar adeptos?

Pois bem, ele se encontrou em agosto com Eduardo Bolsonaro. Bolsonaro disse que o Bannon apoiaria a campanha do seu pai com suporte e “dicas de internet”, essas coisas. Bannon é agora um “consultor eventual” da campanha. Era o candidato ideal pra ele, por compartilhava suas ideias, no cenário ideal: um país passando por uma grave crise econômica com a população desiludida com a sua classe política.

Logo depois de manifestações de mulheres nas ruas de todo o Brasil e do mundo contra Bolsonaro, o apoio do candidato subiu, entre o público feminino, de 18 para 24 por cento. Um aumento de 6 pontos depois de grande parte das mulheres se unir para demonstrar sua insatisfação com o candidato.

Isso acontece porque, de um lado, a grande mídia simplesmente ignorou as manifestações e, por outro, houve um ataque preciso às manifestações através dos grupos de whatsapp pró-Bolsonaro. Vídeos foram editados com cenas de outras manifestações, com mulheres mostrando os seios ou quebrando imagens sacras, mas utilizadas dessa vez para desmoralizar o movimento #elenão entre as mais conservadoras.

Além disso, Eduardo Bolsonaro veio a público logo após a manifestação e declarou: “As mulheres de direita são mais bonitas que as de esquerda. Elas não mostram os peitos e nem defecam nas ruas. As mulheres de direita têm mais higiene.” Essa declaração pode parece pueril ou simplesmente estúpida mas é feita sob medida para estimular um sentimento de repulsa para com o “outro lado”.

Isso não é nenhuma novidade. A máquina de propaganda do nazismo alemão associava os judeus a ratos. O discurso era que os judeus estavam infestando as cidades alemãs como os ratos. Esse é um discurso que associa o sentimento de repulsa e nojo a uma determinada população, o que faz com que o indivíduo queira se identificar com o lado “limpo” da história. Daí os 6 por cento das mulheres que passaram a se identificar com o Bolsonaro.

Agora é possível compreender porque é tão difícil usar argumentos racionais para dialogar com um eleitor do Bolsonaro? Agora você se dá conta do nível de manipulação emocional a que seus amigos e familiares estão expostos? Então a pergunta é: “o que fazer?”

Não adiante confrontá-los e acusá-los de massa de manobra. Isso só vai fazer com que eles se fechem e classifiquem você como um inimigo “do outro lado”. Ser chamado de manipulado pode ser interpretado como ser chamado de burro, o que só vai gerar uma troca de insultos improdutiva.

Tenha empatia. Essas pessoas não são tolas ou malvadas; elas estão tendo suas emoções manipuladas e estão submetidas a uma percepção da realidade bastante diferente da sua.

Tente trazê-las aos poucos para a razão. Não ofereça seus argumentos racionais logo de cara, eles não vão funcionar com essas pessoas. A única maneira de mudar seu pensamento é fazer com que tais pessoas percebam sozinhas que não há argumentos que fundamentem suas crenças e as notícias veiculadas de maneira falsa.

Isso só pode ser feito com uma grande dose de paciência e de escuta. Peça para que a pessoa defenda racionalmente suas decisões políticas. Esteja aberto para ouvi-la, mas continue sempre perguntando mais e mais, até ela perceber que chegou num ponto em que não tem argumentos para responder.

Pergunte, por exemplo: “Por que você decidiu por esse candidato? Por que você acha que ele vai mudar as coisas? Você acha que ele está preparado? Você conhece as propostas dele? Conhece o histórico dele como político? Quais realizações ele fez antes que você aprova?”

Em muitos casos, a pessoa tentará mudar o discurso para falar mal de um outro partido ou do movimento feminista. Tal estratégia é esperada porque eles foram programados para achar que isso representa “o outro lado”, os inimigos a combater.

Nesse caso, o caminho continua o mesmo: tentar trazer a pessoa para sua própria razão: “Por que você acha que esse partido é tão ruim assim? Sua vida melhorou ou piorou quando esse partido estava no poder? Como você conhece o movimento feminista? Você já participou de alguma reunião feminista ou conhece alguém envolvido nessa luta?”

Se perceber que a pessoa não está pronta para debater, simplesmente retire-se da discussão. Não agrida ou nem ofenda, comportamento que radicalizaria o pensamento de “somos nós contra eles”. Tenha em mente que os discursos que essa pessoa acredita foram incutidos nela de maneira que houvesse uma verdadeira identificação emocional, se tornando uma espécie de segunda identidade. Não é de uma hora pra outra que se muda algo assim.

Duas das mais importantes democracias do mundo já foram hackeadas utilizando tais técnicas de manipulação. O alvo atual é o nosso país, com uma das mais importantes democracias do mundo. Não vamos deixar que essas forças nos joguem uns contra os outros, rasgando nosso tecido social de uma maneira irrecuperável.

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P.S.: Por favor, pesquise extensamente sobre todo e qualquer assunto que expus aqui, e sobre o qual você esteja em dúvida. Não sou de nenhum partido. Sou filósofo e, como filósofo, me interesso pela verdade, pela ética e pelo verdadeiro debate de ideias.

sábado, 12 de maio de 2018

O que é COMUNISMO, afinal? – Para além do senso comum

Em homenagem aos 200 anos de Karl Marx


Comunismo NÃO É um sistema.
Comunismo é uma forma de sociabilidade que há de ser vivida sobre o pressuposto da produção e reprodução (dos indivíduos e da sociedade) calcada numa forma de propriedade (apropriação dos meios e fins do trabalho) de caráter social, donde o comunismo ser um socialismo.
Por esse mesmo motivo, o comunismo não é e não pode ser falho, pois sociabilidade não possui função.
Quando alguém acredita que o comunismo “não funciona”, é porque tem uma noção bem fantasiosa do que seja a sociedade: é uma coisa, ou melhor, uma outra coisa que os indivíduos associados – uma sociedade existente independente dos indivíduos, um “sistema” pairando sobre eles. Durkheim merecia ver isso!
Comunismo e capitalismo não são coisas, não são “modelos”, “sistemas”, esquemas, planejamentos de engenharia social ou anti-social, mas sim formas distintas de associação entre indivíduos, modos herdados e posteriormente reproduzidos por eles para organizarem entre si – no intuito de, simplesmente e antes de tudo o mais, sobreviverem – suas relações com a natureza; ou seja, o trabalho, a divisão do trabalho, a divisão dos produtos do trabalho etc.
Portanto, comunismo e capitalismo não são máquinas – que funcionam ou não, pois não são algo distinto dos indivíduos, um algo que “tem de funcionar”.
Também não estamos falando de formas de Estado, de regime político, governos etc. – aliás, assuntos que só os puros de alma crêem que devam ser pensados em termos funcionais, se é que funcionam de qualquer jeito. Quer dizer, funcionam: especialmente quando parece o contrário.
Estamos falando de pessoas vivendo suas vidas e o tempo todo em relação umas com as outras. Será que uma pessoa deve ser avaliada na medida em que “funciona”?
Trata-se de formas de sociabilidade, de um fazer-se cotidiano e entre todos os demais (Marx fala da vida prática de homens vivos e ativos); daí que a avaliação de uma forma social só pode ser realizada com seriedade se levar em conta a sua história, sua localização geográfica, suas relações econômicas e políticas internas e com as demais sociedades etc. 

Não nos preocupemos, por exemplo, em virar uma “nova Venezuela” ou Cuba. Isso só seria possível apagando tudo que faz o Brasil, a Venezuela e Cuba serem exatamente o que são – Brasil, Venezuela e Cuba. Nem um jogador de WAR pensa de maneira tão rasa.
Se as tentativas (supondo que realmente foram) dos países ditos socialistas do século XX em transformar a sociedade naufragaram, não é porque os planos de Marx estavam errados. Primeiro, porque Marx não tinha tais planos; e depois, porque esses países existiam na realidade e não na fantasia.
Ao contrário do que reza o empirismo trivial dos “críticos dos sistemas”, a realidade é muito mais que aquilo que está estampado em nossas retinas. É assim que Tomé virou crente: olhou o céu e viu o Sol girar em torno da Terra. E depois viu a Terra girar em torno de seus olhos.

Se alguma “ciência” social qualquer considera socialismo e capitalismo como “sistemas sócio-econômicos”, é porque, antes de tudo, além de estar descompromissada com a verdade, está compromissada com seus financiadores. A razão crítica lhe é socialmente vedada.
O relacionamento cotidiano entre indivíduos, a partir do que herdam das gerações passadas (história), em meio a determinados espaços geográficos, onde organizam o trabalho (relações econômicas) e dividem os papéis na produção e os direitos no consumo (política) nada tem de sistemático, muito menos é um modelito social. Estamos falando da prática viva de indivíduos vivos.
E quanto ao aspecto teórico: a ideologia comunista não é um TED ou um stand-upde esquemas e propostas. É uma crítica à forma atual do indivíduo viver em meio a outros indivíduos, no interior da qual se vislumbra uma saída da monstruosidade moderna. 

Comunismo não é uma “nova política” para aplicar por sobre o capitalismo (a noção mesma de aplicação de teorias, modelos etc. já denuncia a tremenda falta de sentido ontológico que dá consistência ao mingau produtor das sinapses críticas). Por pensar assim que os austrólogos imaginam refutar Marx por meio de problemas que só fazem sentido numa economia capitalista (como, p.ex., o “cálculo econômico” – que o capitalismo não parece saber fazer muito bem, se é que pretende). Projetam no comunismo o que não ultrapassa a caixinha que encerra seus pensamentos.
Comunismo não é alternativa de organização econômica, política ou ideológica do mercado. Não é produção para a troca. Comunismo é sociedade de consumo. Produção para atender as necessidades de consumo dos indivíduos. Ao contrário disso, e do que circula no senso comum, capitalismo é o exato oposto de umasociedade de consumo; é sociedade mercantil. No capitalismo o consumo dos indivíduos e os próprios indivíduos simplesmente não interessam; importa unicamente valorizar o capital, custe a humanidade e a natureza se preciso for.
Comunismo não é quando o trabalhador tem propriedade dos frutos de seu próprio trabalho; a partir da qual, troca seu produto por outro que necessita mas não produz.
Não se trata de ter posse privada nenhuma do que se produz, com fins a usar o produto como capital ou dinheiro, pois do contrário estaríamos na situação da troca enquanto escambo. Ora, no comunismo não há troca ou produção para o mercado, e antes de tudo porque, nele, ambos são dispensáveis. Uma produção que visa o consumo não mede os produtos entre si, ou seja, prescinde da existência do valor. O que determina a economia  são as necessidades do indivíduo, e elas não são condicionadas por suas capacidades manuais e intelectuais de produção. A satisfação das carências do indivíduo não se subordinam ao que ele pode e consegue produzir.
A economia comunista é baseada no compartilhamento dos produtos de trabalhos que se desenvolvem de acordo com as necessidades, os interesses e gostos dos produtores. Tal compartilhamento é social, e não coletivo. Não há mesmo a necessidade de qualquer contato físico entre os indivíduos que disponibilizam os produtos. Estamos falando de uma sociabilidade pós-capitalista, e não tribal.
O compartilhamento social é uma utopia ou já se entrevê na realidade?
Assim como meio de produção não se confunde com o produto final, tão logo o indivíduo se apropria de um bem designado ao seu consumo pessoal (pois, no comunismo, todo produto se destina ao consumo, ao contrário do que ocorre na sociedade mercantil moderna), não há porque contestar seu direito de posse e usufruto sobre ele. Aliás, conceber o questionamento de tal direito se torna puro nonsense.
Nota bene: não se trata de dizer que “se a classe trabalhadora tudo produz, a ela tudo pertence”; pois o que é isso, uma classe social, a quem tudo pertenceria? Como poderia uma classe social ser proprietária de quaisquer bens, como uma classe social poderia usufruir deles? Por outro lado: como a produção seria propriedade de cada indivíduo da classe trabalhadora? Como se determinaria a distribuição da parte de cada um no interior da classe trabalhadora sem reduzir o indivíduo ao mero dispêndio de sua força em certa quantidade de tempo trabalhado – ou haveria outra medida do que poderia ser seu direito? Pois essa redução configura a determinação comum aos indivíduos da classe. Essa redução é a redução dos indivíduos à classe, sua abstração enquanto apenas trabalhadores, meros “proprietários” ou provedores de mera força de trabalho. E toda essa questão quando o que interessa é acabar com as classes sociais!

Comunismo não é uma forma diferente de Estado, é a destruição ou a caducidade do Estado.
“Ora, mas e a ditadura do proletariado?…”
No Manifesto Comunista de 1848 – este que foi o divisor de águas da história moderna, o ano que uma revolução proletária varreu toda a Europa, tornando reacionária e mesquinha a até então iluminista e esclarecida classe burguesa, marcando o início da decadência da sociabilidade do capital –, Marx diz:
— “Horrorizai-vos porque queremos abolir a propriedade privada. Mas em vossa sociedade a propriedade privada está abolida para nove décimos de seus membros. E é precisamente porque não existe para estes nove décimos que ela existe para vós. Acusai-nos, portanto, de querer abolir uma forma de propriedade que só pode existir com a condição de privar de toda propriedade a imensa maioria da sociedade.
/…/ a primeira fase da revolução operária é o advento do proletariado como classe dominante, a conquista da democracia.
O proletariado utilizará sua supremacia política para arrancar pouco a pouco todo capital à burguesia, para centralizar todos os instrumentos de produção nas mãos do Estado, isto é, do proletariado organizado em classe dominante, e para aumentar o mais rapidamente possível o total das forças produtivas [grifos meus: estamos longe de qualquer hobbesianismo aqui].
Isto naturalmente só poderá realizar-se, a princípio, por uma violação despótica do direito de propriedade e das relações de produção burguesas, isto é, pela aplicação de medidas que, do ponto de vista econômico, parecerão insuficientes e insustentáveis, mas que no desenrolar do movimento ultrapassarão a si mesmas e serão indispensáveis para transformar radicalmente todo o modo de produção”.
Eis aí a democracia como o próprio modo de exercício da ditadura dos trabalhadores. Seu caráter será de autêntica democracia na proporção mesma em que essa ditadura for bem sucedida no que interessa, sua finalidade sine qua non, que lhe dá seu tom próprio e específico: investir o poder político contra a propriedade privada que sustenta a dominação burguesa.
Por fim, emancipada do arraigado moedor social de carne humana, a propriedade privada, os indivíduos podem abolir o tolhimento que as classes sociais, o mercado, o dinheiro, “a economia” etc. lhes impõem, e a sociedade pode se expurgar do gigantesco representante oficial do capital, o Estado:
— “Uma vez desaparecidos os antagonismos de classe no curso do desenvolvimento, e sendo concentrada toda a produção nas mãos dos indivíduos associadoso poder público perderá seu caráter político. O poder político é o poder organizado de uma classe para a opressão de outra. Se o proletariado, em sua luta contra a burguesia, se constitui forçosamente em classe, se se converte por uma revolução em classe dominante e, como classe dominante, destrói violentamente as antigas relações de produção, destrói juntamente com essas relações de produção as condições dos antagonismos entre as classes e as classes em geral e, com isso, sua própria dominação como classe.
Em lugar da antiga sociedade burguesa, com suas classes e antagonismos de classes, surge uma associação – onde o livre desenvolvimento de cada um é a condição do livre desenvolvimento de todos”.

É preciso atentar para algo essencial: estamos falando de revolução.
Não há revolução sem que seja preciso tomar o poder material do Estado, porque do contrário, o Estado irá sufocar a revolução, tal como faz com a mais ínfima greve. O Estado sufoca greves porque o Estado é a antítese da revolução, e uma greve é o pré-vestibular desta.
De fato, se não houver o contexto de uma revolução dos trabalhadores, tomar o poder é o mesmo que manter o poder, pois ele apenas muda de mãos. Ora, mas aí a ditadura “do proletariado” não seria ditadura do proletariado, seria ditadura de um grupo em torno de um ditador.
A finalidade da ditadura do proletariado, ao contrário (isto é, no contexto de uma revolução), não é política – no sentido em que visa apenas tornar ineficaz “a oposição” (enquanto mera oposição política) –, e sim social: trata-se, imediatamente, de tornar ineficaz a contra-revolução; mas, acima de tudo, trata-se de sufocar as forças despóticas do capital como um todo. Daí ser o único caminho real, não-utópico, da realização de uma verdadeira democracia, assentada na soberania dos trabalhadores; e esta é a única soberania legítima, uma vez que é calcada nos legítimos produtores do mundo social.
Isso é a revolução, da qual a ditadura do proletariado é apenas um meio. A finalidade imediata da ditadura do proletariado não é política, senão enquanto visa acabar com a própria política. O que pressupõe sua finalidade maior, condição necessária daquela, a socialização da propriedade privada (e eis aqui o que é o essencial, onde está posta a diferença entre comunismo e anarquismo; pois este mira a copa estatal como determinante da raiz social, quando não simplesmente ignora esta – e não é por outra razão que o anarquismo é apropriado pela direita e vira proposta de um capitalismo à là Somália).
Donde a democracia realmente social deve finalmente terminar dissolvendo a si mesma, última forma de Estado e regime de governo, na medida em que o fim da propriedade privada (e portanto das classes sociais) os torna obsoletos, caducos.
Pois a organização da sociedade por quem a produz e reproduz é precisamente a desintegração das classes sociais, ou seja, da parasitagem exercida por quem não trabalha sobre quem trabalha. Não há mais sustentação real para existir um aparato de dominação e nem o exercício desta.
O fim da propriedade privada é não apenas a finalidade, mas também o fim da ditadura do proletariado. E a revolução social é o meio para tornar social a apropriação dos meios e fins da produção. E não haverá outro. 
Sem revolução, nada feito.

Alguém pode perguntar: “que garantia terei que um governo dos trabalhadores não irá se transformar em uma outra ditadura de novos senhores?”
Nenhuma.
“Garantia” é uma noção criada pelo e usada para o mercado, nada mais que uma promessa para conquistar consumidores e vencer a concorrência. E nem assim o comércio garante realmente alguma coisa (pra qualquer problema existe a “justiça” do consumidor, na qual o indivíduo será mais um entre milhares a tentar reverter uma situação na qual foi lesado). “Garantia” é, portanto, uma noção mais fictícia que real. Nada que existe é garantido.
Mas uma coisa é certa: as galinhas só passam a tomar conta do galinheiro quando este galinheiro está organizado o suficiente para expulsar as raposas que desde sempre o comandaram.
Portanto, a ditadura do proletariado pressupõe uma abertura real à participação popular, sem a qual ela não acontece. E isso não é nada, mas menos ainda é pouco.
Não há ditadores na ditadura do proletariado. A revolução é que orienta o processo: trata-se da sociedade se auto-organizar, a ponto de se despir da necessidade de uma esfera acima dela a comandar-lhe.
Eis a tarefa histórica que devemos a nós mesmos e às futuras gerações. Herdamos esta dívida, e ela só tem crescido, enquanto o prazo se esgota. Pelo que estamos aqui, senão pela humanidade?

Marx e Engels na tipografia do Manifesto de 1848

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Análise do Projeto de Lei que criminaliza o comunismo


Fiz uma análise rápida do Projeto de Lei 5358/16 do deputado Eduardo Bolsonaro, que criminaliza a apologia ao comunismo.

Ela segue cada parágrafo do PL, o que a faz carente de consistência própria. Por isso, a deixo aberta pra quem quiser (e  puder) fazer ajustes, inclusões (especialmente de fontes), exclusões e mudanças que forem necessários, de forma a torná-la melhor.

A intenção é encaminhá-la aos deputados para mostrar-lhes o porquê do PL ser antidemocrático, etc.; mas é preciso, mais que isso, organizar bem a rejeição social da proposta, de modo a pressioná-los para vetar o projeto.

O PL está mais abaixo, logo em seguida.


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A proposta de alterar a Lei nº 7.716 para incluir como forma de crime o "fomento ao embate de classes sociais" - no qual se utilizaria "quaisquer meios de divulgação favorável ao comunismo", bem como "fazer apologia a pessoas que praticaram atos terroristas a qualquer pretexto bem como a regimes comunistas" - é evidentemente autoritária, na medida  que a definição do que seria uma divulgação "favorável" ou "apologética" do comunismo pode depender inteiramente de uma interpretação subjetiva, política e ideológica por parte dos agentes que a denunciarem.

Além disso, há um vício de entendimento na idéia de se "fomentar o embate de classes sociais": pois, uma vez que a sociedade está dividida em distintas classes (e o PL admite este fato), já se pressupõe que há "embate" entre elas; do contrário, não faria sentido falar em classe social nenhuma.

A afirmação de que há um antagonismo de interesses entre as classes sociais não proveio da imaginação fértil e diabólica de nenhum indivíduo ou grupo que pretendia criar uma arma ideológica para seus fins políticos particulares, mas sim da constatação de uma relação inversa entre o lucro e o salário. Quanto maior o segundo, menor o primeiro, uma vez que salário é custo de produção; donde surge a "luta de classes" entre capitalistas e trabalhadores. Aliás, é exatamente desta ocupação de lugares opostos na esfera da produção que emerge a divisão da sociedade em classes sociais. A percepção da contradição entre ambas já se encontra em teóricos franceses à época da Revolução Francesa e também em David Ricardo, economista inglês acima de quaisquer suspeitas de possuir interesses revolucionários e comunistas.

Por outro lado, a justificação do projeto traz um amontoado de mitos disseminados no senso comum para sustentá-lo.

O primeiro deles é a afirmação de que "os regimes comunistas mataram mais de 100 milhões de pessoas em todo o mundo". Há ampla divergência entre os adversários do comunismo acerca desse número, e completa escassez de fontes sobre ele (cf.: Afinal, quantos milhões o "comunismo" matou?).

O segundo é de que o comunismo é um "regime" de Estado, baseado em "ideais de igualdade entre as classes sociais". Ora essa, os comunistas visam uma sociedade sem Estado; e não pode haver classes sociais se elas se tornam iguais. Sequer se pretende uma igualdade entre indivíduos - aliás, essa é uma bandeira da revolução que ocorreu em 1789... na França.

A justificação segue apelando para uma leitura inteira e explicitamente subjetiva, política e ideológica ao dizer que "ocorre /.../ o contínuo fomento de formas subliminar, velada ou mesmo ostensiva, da luta entre grupos distintos, que se materializam em textos jornalísticos, falsas expressões culturais, doutrinação escolar, atuações político-partidárias dentre outras, sempre com a pseudo intenção da busca pela justiça social". Como identificar o fomento de "formas subliminar e velada" da "luta entre grupos distintos"? Que luta é essa? O que são "falsas expressões culturais"? O que é "doutrinação escolar"? Por que a "intenção da busca pela justiça social" é uma "pseudo-intenção"?

Será que "os adeptos dessa ideologia estão dispostos a tudo"? Se eles "já perpetraram toda a sorte de barbáries contra agentes do Estado", quais foram essas "barbáries"? Por que estariam dispostos a novamente perpetrá-las?

Ao se oporem ao "chamado" regime militar (quem é que chama a ditadura militar de "regime militar"?), eles tinham, segundo o autor, por escopo implantar a "ditadura do proletariado". O que é isso, a "ditadura do proletariado"? Se é "do proletariado", ou seja, de uma classe social, em que medida ela é uma "ditadura" como outra qualquer, tal como a do "regime militar"?

O autor prossegue dizendo que "a mentira é o oxigênio desses canalhas travestidos de idealistas do bem comum". Isso é um argumento?

Como o autor pode demonstrar que "distorcem a realidade da história e manipulam o inconsciente coletivo vendendo a ideia da perfeição do comunismo e a satanização de tudo que a ele se contraponha"?

Tudo indica que o deputado entende bem o que seja "satanização de tudo que a ele se contraponha".

Se é verdade que a Polônia, Ucrânia, Lituânia, Geórgia e Moldávia proíbem em seu ordenamento legal a ideologia e mesmo o uso de símbolos que fazem referência ao comunismo, o que isso significa? Por que os EUA não os proíbem?

Quais são as reais intenções dos comunistas? De fato, trata-se de "justiça social". Quais são as reais intenções de Bolsonaro?

Será que os comunistas são um todo homogêneo e concordam em bloco com a prática de assaltos a bancos e quartéis, sequestros, explosões e mortes de todo o tipo?

Se é verdade que "muitos que defendem as premissas comunistas são, de fato, pessoas bem-intencionadas, mas os que estão à frente desse levante usam da mentira para iludir e manipular a boa-fé de inocentes úteis ao seu projeto de poder", como o Estado pode intervir nessa "manipulação" com uma lei que desrespeita o direito das pessoas bem-intencionadas de acreditarem em tais "premissas comunistas"? Em que medida os que estão à frente desse projeto de lei não estão usando da mentira para iludir e manipular a boa-fé de inocentes úteis ao seu projeto de poder?

A idealização do professor de história e da infantilização dos alunos é notável no discurso do deputado. Trata-se da mesma idéia da sala de aula enquanto lavanderia de cérebros que a Escola Sem Partido sustenta, com fins a policiar e censurar a atividade docente, de modo que a única "doutrinação" que os professores possam levar a cabo seja a "correta". Trata-se de fabricar um espantalho para servir como a figura de um "inimigo" da democracia, de modo a justificar o cerceamento da livre expressão e da mesma democracia, devidamente travestido sob os "ideais democráticos" - ideais de um grupo político em particular, no qual milita o autor do projeto.

O deputado pretende que avaliemos de forma negativa o engajamento dos jovens "na defesa de uma sociedade mais justa" e que não questionemos o papel das Forças Armadas "no cumprimento de seu dever constitucional" - ao usurpar o poder de Estado "em passado próximo", quando instauraram uma ditadura sanguinária, cujos crimes de prisões políticas, torturas e assassinatos jamais foram julgados no Brasil democrático. E mais: que não nos comovamos ao ouvir os relatos do terror da tortura. 

"Não cabe defesa à tortura"; mas isso é o que o autor do projeto faz, de forma "subliminar e velada", ou talvez não muito. Afinal, "o Estado brasileiro ~teve de usar seus recursos~ para fazer frente a grupos que não admitiam a ordem vigente", aquela que derrubou por meio de um golpe o governo legítimo de João Goulart, fechou o Congresso, pôs partidos opositores na ilegalidade e, "sob esse argumento, implantaram o terror no país".

"Os militares e os demais agentes públicos tiveram seus ~eventuais excessos~ apurados e punidos como de praxe se faz na caserna", ou seja, não foram nem uma coisa, nem outra. Além disso, os agentes públicos não-militares não estão sujeitos a tribunais de caserna.

O auge do cinismo está no momento em que o deputado afirma que "o Poder Judiciário nunca foi alijado do acompanhamento das questões relativas ao seu mister" para legitimar os "recursos do Estado" e afirmar as supostas apurações e punições aos "excessos", ao mesmo tempo que escarnece da democracia brasileira e da população "iludida" e critica a Comissão Nacional da Verdade em termos os mais subjetivos e rebaixados. 

Chama Fidel Castro, Che Guevara, Carlos Lamarca e Carlos Marighella de "facínoras sanguinários", ao mesmo tempo que defende o Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. 

"É hora de dar um basta" ao nefasto anti-comunismo de Eduardo Bolsonaro et caterva e suas mentiras e tentativas de iludir-nos e manipular-nos; o que a identificação de comunismo e nazismo deixa explícita pra qualquer indivíduo minimamente bem informado acerca de ambos. 

O autor afirma que Cuba é comunista e não permite ao cidadão a liberdade de ter opiniões, o que só seria possível numa sociedade de máquinas ou animais, "e até mesmo de ir e vir", apesar de Yoani Sánchez provar o contrário.

A ingenuidade de Bolsonaro sobre o comunismo é tal que ele julga possível haver e proibir "atos preparatórios ao comunismo", como se esse fosse um regime político a ser instaurado por meio de um golpe, tal como o de 64 (que ele defende), ou um atentado terrorista, como o que seu pai planejou para atacar a ESAO em outubro de 1987

Se a proposta apresentada de fato tem por finalidade "dar um basta na manipulação mentirosa perpetrada há anos por políticos profissionais que iludem pessoas bem intencionadas e distorcem fatos históricos", ela devia consistir, em primeiríssimo lugar, na renúncia e abandono da vida pública pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro.


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PROJETO DE LEI Nº             DE 2016. 
(Do Sr. Eduardo Bolsonaro)  
Altera a redação da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 e da Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, para criminalizar a apologia ao comunismo.   

O Congresso Nacional decreta:  
Art. 1º Fica alterada a redação da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 e da Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, para criminalizar a apologia ao comunismo. 
Art. 2º A Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passa a vigorar com as seguintes alterações em seus artigos 1º e 20, caput e § 1º, nos seguintes termos: 
“Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, procedência nacional ou de fomento ao embate de classes sociais. (NR) 
(...)  
Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, procedência nacional ou fomentar o embate de classes sociais. (NR) 
§ 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, a foice e o martelo ou quaisquer outros meios para fins de divulgação favorável ao nazismo ou ao comunismo.” (NR)  
Art. 3º A Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, passa a vigorar com as alterações em seu artigo 2º, caput, a supressão do § 2º respectivo e a inclusão do inciso III ao artigo 5º, nos seguintes termos: 
“Art. 2º O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, ou de fomento ao embate de classes sociais, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública. (NR) 
(...) 
§ 2º SUPRIMIDO 
(...) 
Art. 5º ......................................................................................... 
III – Fazer apologia a pessoas que praticaram atos terroristas a qualquer pretexto bem como a regimes comunistas. (NR)”  

JUSTIFICAÇÃO 

Os regimes comunistas mataram mais de 100 milhões de pessoas em todo o mundo e mesmo assim, agremiações de diversas matizes, defendem esse nefasto regime, mascarando as reais faces do terror em ideais de igualdade entre as classes sociais. 

O que ocorre, na verdade, é o contínuo fomento de formas subliminar, velada ou mesmo ostensiva, da luta entre grupos distintos, que se materializam em textos jornalísticos, falsas expressões culturais, doutrinação escolar, atuações político-partidárias dentre outras, sempre com a pseudo intenção da busca pela justiça social. 

Em nome desses “ideais” os adeptos dessa ideologia estão dispostos a tudo e já perpetraram toda a sorte de barbáries contra agentes do Estado que objetivaram neutralizar sua “causa”. 

No Brasil, especialmente nas décadas de 1960 e 1970, muitos integrantes de grupos criminosos justificaram inúmeros atos terroristas por, em tese, se oporem ao chamado regime militar, bradando lutar por democracia, quando, de fato, tinham por escopo implantar a “ditadura do proletariado”. 

A mentira é o oxigênio desses canalhas travestidos de idealistas do bem comum. 

Onde for possível repetem, incansavelmente, mantras que distorcem a realidade da história e manipulam o inconsciente coletivo vendendo a ideia da perfeição do comunismo e a satanização de tudo que a ele se contraponha. 

Alguns países já proíbem em seu ordenamento legal a ideologia e mesmo o uso de símbolos que fazem referência a esse perverso regime, como Polônia, Ucrânia, Lituânia, Geórgia e Moldávia. 

No Brasil, mesmo antes do auge dos atos terroristas contra o Estado, movimentos deflagrados em 1935 nos estados de Pernambuco, Rio Grande do Norte e no Distrito Federal já delineavam as reais intenções dos comunistas. 

Em 1952, o Deputado Humberto Moura (UDN/CE) propôs a criação da Medalha de Mérito anticomunismo por meio do Projeto de Lei nº 1.857. 

No mesmo ano, o Deputado Dario de Barros (PTN/SP) apresentou o Projeto de Resolução nº 163 para criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a amplitude da penetração comunista no País e alertava que os órgãos mais representativos da imprensa sistematicamente chamavam a atenção das autoridades para o perigo de um movimento de sublevação da ordem planejado por elementos comunistas. 

Mas os comunistas não se resumiram a praticar assaltos a bancos e quartéis, sequestros, explosões e mortes de todo o tipo. Foram além. Seus ideais se ramificaram nos meios acadêmicos, jornalísticos, sindicais, políticos e artísticos. 

Em 1961, o Deputado Mendes de Moraes (PSP/DF), apresentou o Projeto de Lei nº 3.016 visando a repressão e defesa contra a implantação e propaganda do regime comunista. Em sua justificativa afirmava a incontestável ameaça sobre Brasil e todo o Continente Americano, em razão do que ocorrera em Cuba e da influência e ajuda ostensiva da U.R.S.S. e da China.   

Cabe destacar que muitos que defendem as premissas comunistas são, de fato, pessoas bem-intencionadas, mas os que estão à frente desse levante não. Usam da mentira para iludir e manipular a boa-fé de inocentes úteis ao seu projeto de poder. 

Quantos jovens já não se encantaram pelo discurso apaixonado do “professor” de história e entregaram seu vigor engajando-se na defesa de uma sociedade mais justa? Quantos já não se questionaram do papel das Forças Armadas no cumprimento de seu dever constitucional, em passado próximo, ao lerem as matérias atuais de alguns meios de comunicação? Quantos já não se comoveram ao verem seu ídolo, artista, músico, apresentador relatando o terror da tortura? 

Não cabe defesa à tortura, mas esta, se ocorreu, não precedeu ao terrorismo. O contrário é verdadeiro. O Estado brasileiro teve de usar seus recursos para fazer frente a grupos que não admitiam a ordem vigente e, sob esse argumento, implantaram o terror no país. 

Os militares, em especial, e os demais agentes públicos cumpriram sua missão tendo seus eventuais excessos apurados e punidos como de praxe se faz na caserna. O Poder Judiciário nunca foi alijado do acompanhamento das questões relativas ao seu mister. 

A democracia brasileira, ainda que careça de aperfeiçoamento, permitiu que essa ideologia comunista se estabelecesse formalmente. Permitiu que uma presidente fosse eleita mesmo sendo egressa de grupos que praticaram o terrorismo no Brasil, ainda que para isso tenha usado, aos moldes de seu antecessor, o recurso da mentira iludindo e manipulando a população. 

Esses governos, a todo tempo, tentam implantar suas falácias na consciência coletiva. A exemplo da Comissão Nacional da Verdade que, ao analisar apenas um lado da história, tratou os “guerrilheiros” de modo glamoroso, transformado apenas os militares e demais agentes do Estado em criminosos. Os mesmos que defendem e exaltam Fidel Castro, Che Guevara, Carlos Lamarca, Carlos Marighella, dentre outros facínoras sanguinários, são os que se escandalizam com referências ao Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. 

O Coronel Ustra atuou no DOI-CODE, órgão oficial do Estado de repressão ao terrorismo, em 1970. Em 1969, Marighella publicou seu “Manual de Guerrilha”, que ensinava como matar, roubar, sequestrar, praticar atentados contra militares... 

É hora de dar um basta. O Comunismo é tão nefasto quanto o Nazismo e, se já reconhecemos em nosso ordenamento jurídico a objeção ao segundo, devemos também fazê-lo em relação ao primeiro. 

Como sabemos, em todos os países governados sob o regime comunista, não existe liberdade de imprensa, opiniões, religiões e até mesmo de ir e vir, como se constata, por exemplo, em Cuba. 

Algumas iniciativas nas redes sociais trazem propostas nesse sentido e se mobilizam para conscientizar e angariar apoio popular. Há petições públicas como a do endereço eletrônico “PL ANTI-COMUNISMO” (peticaopublica) e do site “O BRASIL CONTRA O COMUNISMO” (anticomunismo . tv . br). 

Na mesma direção, propomos a alteração em duas leis em vigor no Brasil. 

A primeira delas é a Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 e suas posteriores modificações, que define crimes de discriminação e preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, além de punir a fabricação, comercialização, distribuição ou veiculação de símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada para fins de divulgação do nazismo. No mesmo intento, propomos o acréscimo da represália ao fomento do embate de classes sociais e a proibição do símbolo da “foice e martelo” ou outros em alusão favorável ao comunismo. 

A segunda é a Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, que versa sobre o terrorismo, onde sugerimos alterações para criminalizar a apologia a regimes comunistas como atos preparatórios ao comunismo, suprimindo a exceção feita às manifestações políticas, aos movimentos sociais, sindicais etc. que, por vezes manipulados, depredam o patrimônio público e praticam o terror com suas ações para divulgar seus propósitos. 

Cabe aqui destacar, que defendemos, e assim a legislação já permite, a livre manifestação pacífica de qualquer natureza, desde que respeitadas as normas legais para a manutenção da ordem pública.  

Por fim, a proposta que apresentamos tem por finalidade dar um basta na manipulação mentirosa perpetrada há anos por políticos profissionais que iludem pessoas bem intencionadas e distorcem fatos históricos, ocultando o que verdadeiramente está por trás das falácias comunistas, onde seus regimes mataram milhões de inocentes e promoveram incontáveis atentados.   

Nesse sentido traz a discussão do parlamento tema de alta relevância, calado pela “ditadura do politicamente correto”, mas que deve ser debatido para que a verdade liberte nossa sociedade e nos conduza para a ordem e o progresso. 

Sala das Sessões, em           de maio de 2016.   
EDUARDO BOLSONARO Deputado Federal – PSC/SP


Uma sugestão para a família Bolsonaro



quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Marx: o materialismo contra a dialética





Não existe uma estrada real para a ciência, e
somente aqueles que não temem a fadiga de galgar suas
trilhas escarpadas têm chance de atingir seus cumes
luminosos” (O Capital)
 .

Certos marxistas gostam de dizer que o marxismo se corrige e se apura ao longo de sua história, através de “contribuições” dos mais díspares autores, cujo marxismo e contributo são garantidos por sua fidelidade ao “método do materialismo dialético”.

São incapazes, entretanto, de corrigir ou eliminar essa farsa chamada “dialética marxista”.

Há, dentre outros mais, um texto de Marx claríssimo na crítica à dialética. É o capítulo “O Método da Economia Política”, de seu livro “Miséria da Filosofia”, onde mostra que o pensamento dialético está na verdade em Proudhon, de quem Marx critica o procedimento de encaixotar as categorias econômicas em categorias lógicas, produzidas por um ato especulativo que consiste em galgar os graus da abstração até se chegar em um patamar vazio de determinações, donde tais categorias serem “puras”; posteriormente, tais categorias são organizadas logicamente, e pronto: nasce mais um sistema dialético.

Falar de um “materialismo dialético” é cair imediatamente em uma contradição nos termos, pois enquanto o materialismo é ontológico – trata “o ser” não como categoria pura comum a tudo que existe (e que, portanto, nada tem a dizer de coisa alguma), mas considera “o ser” como um ser, uma coisa, um objeto, síntese de múltiplas determinações, ou seja, concreto, particular, específico, que apela não apenas ao pensamento mas também aos sentidos (pois dentre sua riqueza singular de predicados estão os que o tornam material) -, a dialética é um logicismo, uma fórmula metafísica dotada de “princípio”, não importa que não seja o ser “positivo, estático, eterno, imutável, infinito, perfeito, uno, em-si, esférico, absoluto” da metafísica tradicional (categorias do tempo, do espaço, da forma, do conteúdo, do ato etc. abstraídas e hipostasiadas ao vácuo total), mas sim o “devir”, o movimento tornado categoria pura, síntese da relação contraditória entre a pura “positividade” e a pura “negatividade” (Hegel inicia a “Ciência da Lógica” com a “análise” abstrativante da relação entre os puríssimos “ser” e “nada”, para fazer pipocar daí o “devir”); e de toda essa construção ideal pura, este “processo de contradições e sínteses que põe tudo (?) em movimento”, pretende alcançar o que é a verdade daquilo que é ontológico, concreto, impuro, que apela ao sensível muito antes de apelar ao pensamento filosófico, o que é verdadeiramente um absurdo e só pode se destinar ao fracasso ridículo, como todo bom sistema metafísico.

Donde Marx não partir de nenhuma dialética hegeliana, muito menos enxertando nela “o material” (o que seria um transplante totalmente estranho ao pensamento hegeliano) e retirando dela a “casca” de idéias irracionais do idealismo; algo que, convenhamos, teria sido extremamente banal de se ajeitar e não faria Marx merecer lugar nenhum na história da filosofia e da ciência.

O que Marx faz, ao contrário de partir de um método dialético – que só serve para enquadrar as coisas numa lógica -, é buscar “a lógica específica do objeto específico”, entender o objeto a partir de si mesmo, extrair suas diferenças específicas, compreendê-lo em sua especificidade.

Daí que não se trata nunca de ficar no âmbito abstrato da “aplicação” de categorias abstratas, tais como modo de produção tal, relação social de produção tal, forças produtivas contraditórias a tal, infraestrutura assim, superestrutura assado, logo revolução. Marx, ao contrário disso, investiga as coisas a fundo, e a tal ponto que desmente uma série enorme de receitas distribuídas pelo marxismo de apostila, como p.ex. a idéia de etapas necessárias no desenvolvimento de uma economia para poder transitar ao comunismo (o etapismo, está claro, é fruto do logicismo, da dialética aplicada do éter teorético do mundo das idéias abstratas sobre a realidade concreta da prática – uma tremenda imbecilidade intelectual).

O procedimento de Marx é materialista, crítico-ontológico.

Materialismo não é uma lógica, uma aplicação de métodos ou uma combinação nova de idéias (extraídas, arbitrariamente, do sistema filosófico alheio no qual fazem sentido); como bem viu Lenin, ao proceder ontologicamente, “Marx não nos deu uma Lógica, mas sim a lógica do capital”.

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P.S. – Um interlocutor insistiu na existência de uma dialética em Marx, citando o famoso Posfácio à Segunda Edição de O Capital, onde encontramos um rol de elogios a Hegel e à “forma racional e revolucionária” da dialética, que será “enfiada na cabeça dos novos-ricos do novo Sacro Império Prussiano-Germânico” pela vindoura e intensa “crise geral”.
Chamei-lhe a atenção para as palavras que se encontram dez parágrafos antes:
“O Correio Europeu, de São Petersburgo, em um artigo inteiramente dedicado ao método de O Capital (maio de 1872), considera meu método de investigação estritamente realista, mas o modo de exposição, desgraçadamente, dialético-alemão”.
E em meio à resposta de Marx, temos essas linhas:
“Sem dúvida, deve-se distinguir o modo de exposição segundo sua forma do modo de investigação. A investigação tem de se apropriar da matéria em seus detalhes, analisar suas diferentes formas de desenvolvimento e rastrear seu nexo interno. Somente depois de consumado tal trabalho é que se pode expor adequadamente o movimento real. Se isso é realizado com sucesso, e se a vida da matéria é agora refletida idealmente, o observador pode ter a impressão de se encontrar diante de uma construção a priori”.
O método dialético de Marx é, pois, um método de exposição.
Mas ainda há uma carta escrita a Engels em 1867, na qual se lê:
“Você tem toda razão a respeito de Hofmann. A propósito, você verá na conclusão do meu capítulo III, onde eu esboço a transformação do mestre-artesão em capitalista – como resultado de mudanças puramente quantitativas – que, no texto, eu cito a descoberta de Hegel sobre a lei de transformação de uma mudança meramente quantitativa em uma mudança qualitativa como sendo atestada pela história e, de forma semelhante, pelas ciências naturais”.
A passagem aludida por Marx está no capítulo “Taxa e Massa de Mais Valia” (O Capital) e diz o seguinte:
“As corporações de ofício da Idade Média procuraram impedir pela força a transformação do mestre-artesão em capitalista, limitando a um máximo muito exíguo o número de trabalhadores que um mestre individual pode empregar. O possuidor do dinheiro ou de mercadorias só se transforma realmente num capitalista quando a quantidade desembolsada para a produção ultrapassa em muito o máximo medieval. Aqui, como na ciência da natureza, mostra-se a exatidão da lei, descoberta por Hegel em sua Lógica, de que alterações meramente quantitativas, tendo atingido um determinado ponto, convertem-se em diferenças qualitativas”.
Quanto a isso, cabe dizer que os princípios da dialética hegeliana se assentavam no que Lukács chamou de “a autêntica ontologia de Hegel” (devidamente tornada falsa por meio do logicismo dialético). E quando Marx aponta tais princípios (ou “leis”) no próprio objeto, não está aplicando a dialética de Hegel nele, mas extraindo do objeto o próprio arrimo da aplicação da dialética como método de exposição. Só por isso, aliás, é que tal aplicação é possível e não-arbitrária.
Mas tais princípios não são a afirmação de uma ontologia dialética, uma dialética da natureza ou da realidade dialética em si mesma. Por exemplo, a contradição: é na investigação da mercadoria que Marx a identifica atravessando sua essência constituída por valor-de-uso e valor. De modo algum a contradição é natural aos produtos do trabalho humano, enquanto simples valores-de-uso, mas é assumida por estes em seu existir concreto no modo de produção capitalista, em sua existência objetiva como mercadoria.

Hegel mesmo era um entusiasta da Economia Política. Não retirou seus princípios dialéticos de nenhuma dialética originária, porém os recobriu com os resultados lógicos – a que chegou por via especulativa – e transformou tais princípios em fundamentos de uma verdadeira metafísica, reduzindo a historicidade a uma teologia, com a qual traduziu filosoficamente a Bíblia: no início temos a Idéia, que então é negada por sua alienação original sob a forma de Natureza, para que, ao fim de todo seu trabalho de resgate de si, atinja o estágio absoluto do Espírito revelado. 
Ao contrário disso, e do que crê o marxismo da dialética marxiana a priori, o método dialético de Marx é totalmente a posteriori. Pois bem, nem todos os marxistas retiraram a “casca irracional” da teologia hegeliana e ainda aguardam o Juízo Final sob o comunismo; mas, dentre aqueles que a descascaram, alguns não perceberam que o “invólucro racional” está por ser descoberto nas coisas mesmas, e insistem na metafísica hegeliana de uma lógica dialética pairando sobre a realidade.

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Mais um adendo, em resposta a um interlocutor.
Marx constata um caráter contraditório nas relações categoriais reais da sociabilidade capitalista (como ocorre, p.ex., entre valor de uso e valor). E, ao identificar na dialética hegeliana a exposição de formas GERAIS do movimento da contradição, reconhece aí um mérito, um “caroço racional”, mas situado no patamar da generalidade, fazendo ainda a ressalva de que tal movimento sofre uma mistificação em Hegel.
Marx diz: “Meu método dialético é, em seu fundamento, não apenas diferente do hegeliano, mas oposto direto dele”.
Pois Marx não mistifica a contradição como se esta fosse um “sujeito” que se move na relação antitética entre valor e valor de uso, mas a reconhece como um traço imanente à forma de ser dos produtos realizados pelo trabalho no processo de valorização.
Portanto, Marx não se arrima numa adaptação absurda da lógica idealista em uma concreção materialista, mas se ergue a partir do reconhecimento da objetividade e efetividade de processos, entes e relações, finitos e específicos. A oposição a Hegel é de natureza ontológica, materialista, assentada no que se define como ser, anterior ao – e definidora do – conhecer.
Ao reproduzir tais categorias e relações conceitualmente, Marx não configura uma lógica que permitiria plasmar teoricamente objetos quaisquer. Ao contrário, e prevendo tal impressão (que faz história no marxismo vulgar), afirmou ser necessário ter cuidado para que a forma expressiva e o desenvolvimento da argumentação não tomassem a aparência de uma “pura dialética de conceitos”:
“Será necessário, mais tarde /…/, corrigir o modo idealista da apresentação que produz a aparência de que se trata simplesmente das determinações conceituais e da dialética desses conceitos. Sobretudo, portanto, o clichê: o produto (ou atividade) devém mercadoria; a mercadoria, valor de troca; o valor de troca, dinheiro” (Grundrisse, p. 150, Boitempo).
O que é a dialética vulgar senão isso: a tese devém antítese, que devém síntese, que devém nova antítese etc?
A exposição do desenvolvimento categorial do objeto não é a descrição de uma concatenação lógica mística, mas sim a expressão crítica das conexões das categorias no interior dos complexos examinados, uma explicitação de suas relações reais.
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